Principais alterações trazidas pela lei 14.112, 2020 referente à recuperação judicial, extrajudicial e falência

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No dia 24 de dezembro de 2020, foi publicada a Lei nº 14.112, que introduziu diversas alterações na Lei de Recuperação Judicial, Extrajudicial e Falência (Lei nº 11.101/2005).

Em síntese, as propostas de alterações tiveram como objetivo primordial superar algumas ineficiências da Lei nº 11.101/2005, contudo, algumas alterações foram vetadas pela Presidência da República, mas alguns destes vetos foram derrubados pelo Congresso Nacional.

Conheça a síntese das alterações introduzidas pela Lei nº14.112/2020 na Lei nº 11.101/2005, com a relação dos vetos que entrarão em vigor no próximo dia 24 de abril:

  1. RECUPERAÇÃO JUDICIAL e FALÊNCIA.
  • Proibição de atos de constrição sobre os bens do devedor: A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial passa a implicar a proibição de quaisquer atos de constrição judicial ou extrajudicial, desde que decorrentes de créditos e obrigações sujeitos aos efeitos da falência ou da recuperação judicial.
  • Stay Period: Na recuperação judicial, a suspensão do curso do prazo prescricional das obrigações do devedor, das execuções ajuizadas contra o devedor e dos atos de constrição judicial e extrajudicial, desde que relativos a créditos sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, terá a duração de 180 (centos e oitenta) dias, podendo ser prorrogado pelo mesmo período uma única vez, desde que o devedor não tenha sido responsável pela superação do lapso temporal, não sendo mais permitida a prorrogação do stay period até a deliberação da Assembleia Geral de Credores sobre o plano de recuperação judicial.
  • Plano de Recuperação Judicial apresentado pelos credores: Na hipótese do Plano de Recuperação Judicial apresentado pelo devedor não ser apreciado em Assembleia dentro do prazo de 180 dias (stay period) ou, ainda, sendo rejeitado o Plano apresentado pelo devedor sem que estejam presentes os requisitos legais para a aprovação do Plano pelo juiz (cram down), os credores poderão apresentar um Plano de Recuperação Judicial alternativo.
  • Execução Fiscal: As execuções fiscais continuam não sujeitas aos efeitos da recuperação judicial, porém o Juízo da recuperação judicial é o competente para determinar a substituição de atos de constrição que recaiam sobre os bens de capital essenciais ao funcionamento da atividade empresarial, no curso do stay period, mediante cooperação jurisdicional.
  • Lucros e dividendos: Até o Plano de Recuperação Judicial ser aprovado em Assembleia Geral de Credores, o devedor não poderá distribuir lucros ou dividendos aos seus sócios, sob pena de caracterização do crime de fraude contra credores.
  • Impossibilidade de alienação ou oneração de bens: Após a distribuição da Recuperação Judicial a empresa em Recuperação Judicial não poderá alienar ou onerar bens ou direitos do ativo não circulante, salvo com autorização judicial, após oitiva do Comitê de Credores, ou, ainda, com prévia autorização prevista no Plano de Recuperação Judicial
  • Mediação: A Conciliação e a Mediação passa a ser permitida antecedente ou incidentalmente aos processos de recuperação judicial, especialmente para solucionar litígio nos seguintes casos: a) disputa entre sócios e acionistas; b) litígios envolvendo credores extraconcursais ou não sujeitos à Recuperação Judicial; c) conflitos envolvendo concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial; d) em caso de existência de créditos extraconcursais contra empresa em recuperação judicial, durante estado de calamidade pública; e) negociação de dívidas e formas de pagamento entre empresas em dificuldades e seus credores, em caráter antecedente ao ajuizamento da recuperação judicial, caso em que as empresas em dificuldade, que preencham os requisitos para requererem a concessão de recuperação judicial, poderão obter tutela de urgência cautelar para suspender as execuções contra si ajuizadas pelo prazo de 60 dias para tentativa de composição com os credores. Caso haja o efetivo pedido de recuperação judicial ou extrajudicial, o prazo de suspensão acima mencionado será abatido do prazo do stay period. O acordo celebrado será homologado pelo Juízo competente E, sendo ajuizada Recuperação Judicial em até 360 dias contados do acordo celebrado, o credor terá reconstituído seus direitos e garantias originalmente contratados, com dedução dos valores pagos.
  • Assembleia Geral de Credores: As deliberações poderão ser substituídas por Termo de Adesão, desde que observado o quórum específico.
  • Produtor Rural: A atividade rural exercida por pessoa jurídica poderá ter o período de dois anos de exercício regular das atividades comprovado por meio de apresentação da Escrituração Contábil Fiscal (ECF) ou, para os produtores rurais pessoas físicas, pelo Livro Caixa Digital (LCDPR), pela Declaração de Imposto de Renda de Pessoa Física e balanço patrimonial.

Somente estarão sujeitos à recuperação judicial os créditos: a) decorrentes de atividade exclusivamente rural e descriminados nos documentos contábeis; b) não tenham sido objeto de renegociação com instituição financeira antes do pedido de recuperação judicial. Por outro lado, estão excluídos a) os recursos obtidos junto ao Banco do Brasil e ao BNDES, bem como b) o valor de dívida constituída três anos antes do pedido de recuperação judicial, cuja finalidade foi aquisição de imóvel rural com suas respectivas garantias.

  • Companhias Abertas: Durante o processo de recuperação judicial e até o término das obrigações assumidas no Plano, as sociedades por ações de capital aberto serão obrigadas a instalar e manter em funcionamento o conselho fiscal.
  • Novos meios de reestruturação: Além dos meios já elencados exemplificativamente no artigo 50, foram incluídos expressamente como meios de recuperação judicial a conversão da dívida em capital social e a venda integral da empresa devedora, neste caso, será assegurado aos credores não submetidos ou não aderentes condições equivalentes a que teriam na falência, ocasião em que a devedora será considerada uma unidade produtiva isolada.

Ocorrendo a conversão da dívida em capital, aporte de novos recursos na devedora ou a substituição do administrador, não haverá sucessão ou responsabilidade pelas dívidas existentes de qualquer natureza ao investidor, credor ou novo administrador. Além disso, o imposto sobre a renda e a contribuição social sobre lucro líquido incidentes sobre o ganho de capital decorrente da alienação de bens ou direitos poderão ser parcelados.

  • Perícia Prévia: Após a distribuição da recuperação judicial o juiz poderá nomear profissional para verificar as reais condições de funcionamento da requerente, sua regularidade e efetiva apresentação de todos os documentos na petição inicial, ficando institucionalizada a perícia prévia. Demonstrando o laudo a existência de indícios de fraude, será oficiado o Ministério Público para as providências necessárias.
  • Alienação de UPIs: com a alteração legislativa, passou-se a permitir expressamente que a unidade produtiva isolada abranja bens, direitos e ativos de quaisquer naturezas inclusive participações dos sócios.
  • Tratamento diferenciado aos credores fornecedores: O PRJ poderá prever tratamento diferenciado aos credores fornecedores de bens e serviços necessários a manutenção da atividade econômica, desde que continuem a relação comercial.
  • DIP Finance: No curso do processo de Recuperação Judicial o juiz poderá autorizar a celebração de contratos de financiamento garantidos pela oneração ou alienação fiduciária de bens e direitos pertencentes ao ativo não circulante. Havendo convolação em falência, o contrato de financiamento será imediatamente rescindido, contudo, as garantias constituídas serão conservadas até o limite dos valores entregues antes da sentença de quebra.
  • Consolidação Processual e Substancial: Em linha com o entendimento majoritário da jurisprudência, foi autorizada expressamente a consolidação processual, permitindo que as empresas, que integram grupo sob controle societário comum, possam pedir recuperação judicial conjuntamente formando um litisconsórcio ativo, sendo preservada a independência entre seus ativos e passivos, evitando o ajuizamento de múltiplos processos, de modo a privilegiar a eficiência e a redução dos custos.  De igual modo foi expressamente autorizada a consolidação substancial, ou seja, as empresas devedoras são consideradas como detentoras de um único conjunto de ativos e passivos e, consequentemente, o Plano de Recuperação será uno para todas as empresas devedoras.
  • Dívidas tributárias: Ampliação do parcelamento de 84 para 120 parcelas.
  • Insolvência Transnacional: Na legislação, não havia a regulação de insolvências transnacionais. A alteração legislativa incorporou as regras da Lei Modelo Uncitral. Em suma, a Lei cria um sistema de reconhecimento de processos de insolvência estrangeiros no Brasil, trazendo maior segurança jurídica para a atividade econômica e para os investimentos estrangeiros, estimulando a cooperação e coordenação entre as jurisdições, além dedar maior proteção ao interesse de todos os credores e demais partes envolvidas no processo.
  • Venda total da devedora: Será possível desde que garantidos os direitos dos credores não sujeitos à recuperação ou não aderentes ao Plano apresentado.
  • CND: As empresas em recuperação judicial poderão obter a Certidão Negativa de Débitos para fins de contratação com o poder público.
  •  Fresh Start: A alteração legislativa reduziu o prazo para extinção das obrigações em caso de falência para 3 anos (antes era de 5 anos e, havendo condenação por crime falimentar, era de 10 anos) ou mediante o pagamento de mais de 25% dos créditos quirografários (antes era exigido o pagamento de mais de 50%), permitindo o rápido recomeço no exercício de atividade econômica.
  1. RECUPERAÇÃO EXTRAJUDICIAL.
  • Crédito trabalhista: Inclusão dos créditos de natureza trabalhista e decorrentes de acidente de trabalho, com a presença do sindicato da respectiva classe profissional para as negociações coletivas, que é obrigatória.
  • Alteração do quórum de adesão: Para a homologação do Plano de Recuperação Extrajudicial será necessária a adesão de 50% dos créditos de cada classe onde houve negociação e não mais 3/5.
  • Stay Period: A alteração legislativa passou a permitir a aplicação também para a recuperação extrajudicial do prazo de stay period, seguindo as mesmas regras da Recuperação Judicial, exclusivamente para a as classes de credores abrangidas no Plano.
  1. VETOS
  2. Veto1: § 10, do art. 6º da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

“Na hipótese de recuperação judicial, também serão suspensas as execuções trabalhistas contra responsável, subsidiário ou solidário, até a homologação do plano ou a convolação da recuperação judicial em falência.”

Este veto foi mantido, não incorporado à nova legislação.

  • Veto 2: §13, do art. 6º da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

“Não se sujeitam aos efeitos da recuperação judicial os contratos e obrigações decorrentes dos atos cooperativos praticados pelas sociedades cooperativas com seus cooperados, na forma do art. 79 da Lei nº 5.764, de 16 de dezembro de 1971, consequentemente, não se aplicando a vedação contida no inciso II do art. 2º quando a sociedade operadora de plano de assistência à saúde for cooperativa médica.”

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Veto 3: § único, do art. 60 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

“O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, incluídas, mas não exclusivamente, as de natureza ambiental, regulatória, administrativa, penal, anticorrupção, tributária e trabalhista, observado o disposto no § 1º do art. 141 desta Lei.”

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Veto 4: Art. 66 da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

“Após a distribuição do pedido de recuperação judicial, o devedor não poderá alienar ou onerar bens ou direitos de seu ativo não circulante, inclusive para os fins previstos no art. 67 desta Lei, salvo mediante autorização do juiz, depois de ouvido o Comitê de Credores, se houver, com exceção daqueles previamente autorizados no plano de recuperação judicial.”

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Vetos 5, 6 e 7: Art. 6º-B, caput e incisos I e II, da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005, acrescido pelo art. 2º do projeto de lei.

“Art. 6º -B. Não se aplica o limite percentual de que tratam os arts. 15 e 16 da Lei nº 9.065, de 20 de junho de 1995, à apuração do imposto sobre a renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre a parcela do lucro líquido decorrente de ganho de capital resultante da alienação judicial de bens ou direitos, de que tratam os arts. 60, 66 e 141 desta Lei, pela pessoa jurídica em recuperação judicial ou com falência decretada.

I – pessoa jurídica que seja controladora, controlada, coligada ou interligada; ou

II – pessoa física que seja acionista controlador, sócio, titular ou administrador da pessoa jurídica devedora.”

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Vetos 8, 9 e 10: Art. 50-A, caput e incisos I, II e III, da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

“Art. 50-A. Nas hipóteses de renegociação de dívidas de pessoa jurídica no âmbito de processo de recuperação judicial, estejam as dívidas sujeitas ou não a esta, e do reconhecimento de seus efeitos nas demonstrações financeiras das sociedades, deverão ser observadas as seguintes disposições:

I – a receita obtida pelo devedor não será computada na apuração da base de cálculo da Contribuição para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins);

II – o ganho obtido pelo devedor com a redução da dívida não se sujeitará ao limite percentual de que tratam os arts. 42 e 58 da Lei nº 8.981, de 20 de janeiro de 1995, na apuração do imposto sobre a renda e da CSLL; e

III – as despesas correspondentes às obrigações assumidas no plano de recuperação judicial serão consideradas dedutíveis na determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, desde que não tenham sido objeto de dedução anterior.

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Vetos 11 e 12: Art. 50-A, parágrafo único e incisos I e II, da Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005.

Parágrafo único. O disposto no caput deste artigo não se aplica à hipótese de dívida com:

I – pessoa jurídica que seja controladora, controlada, coligada ou interligada; ou

II – pessoa física que seja acionista controladora, sócia, titular ou administradora da pessoa jurídica devedora.”

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Veto 13: Art. 11, caput, da Lei 8.929, de 1994.

“Art. 11. Não se sujeitarão aos efeitos da recuperação judicial os créditos e as garantias cedulares vinculados à CPR com liquidação física, em caso de antecipação parcial ou integral do preço, ou, ainda, representativa de operação de troca por insumos (barter), subsistindo ao credor o direito à restituição de tais bens que se encontrarem em poder do emitente da cédula ou de qualquer terceiro, salvo motivo de caso fortuito ou força maior que comprovadamente impeça o cumprimento parcial ou total da entrega do produto.

Este veto foi derrubado e incorporado à nova legislação.

  • Veto 14: Art. 11, parágrafo único, da Lei 8.929, de 1994.

“Caberá ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento definir quais atos e eventos caracterizam-se como caso fortuito ou força maior para os efeitos deste artigo.” Este veto foi mantido, não incorporado à nova legislação.

Análise feita por

Carlos Roberto Siqueira Castro
crsc@siqueiracastro.com.br

André Gondinho
gondinho@siqueiracastro.com.br

Emerson Soares Mendes
esmendes@siqueiracastro.com.br

Guilherme Dantas
gdantas@siqueiracastro.com.br

Juliana Castro
juliana@siqueiracastro.com.br