A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que o estelionato sentimental – caracterizado pela simulação de relacionamento amoroso com o objetivo de obter vantagem econômica – configura ato ilícito indenizável por danos morais e materiais. A decisão marca um importante avanço na responsabilização de condutas fraudulentas que se utilizam do afeto, ampliando o alcance do artigo 171 do Código Penal (CP).

No caso concreto (REsp 2.208.310/SP), um homem foi condenado por induzir sua ex-companheira a contrair empréstimos em seu benefício, por meio da simulação de um relacionamento amoroso, com o intuito de obter vantagem financeira ilícita. Durante a relação, a mulher transferiu ao réu cerca de R$ 40 mil, induzida por falsas promessas e manipulação emocional. A relação foi encerrada abruptamente após a recusa da vítima em continuar os repasses.
O STJ entendeu que a fraude emocional viciou o consentimento, configurando vantagem ilícita obtida por meio ardiloso. Segundo a relatora do recurso especial, Ministra Isabel Gallotti, o dolo do agente ficou demonstrado, pois ele tinha consciência da vulnerabilidade emocional da mulher e explorou deliberadamente a confiança da vítima para obter benefício patrimonial, utilizando-se de estratégias enganosas e manipulações.
A decisão reforça a tipificação penal do estelionato também em contextos afetivos, quando presentes os três elementos exigidos pelo art. 171 do CP: obtenção de vantagem ilícita, induzimento ao erro e emprego de meio fraudulento.
No mesmo sentido, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 69/2025, que busca inserir o estelionato sentimental no Código Penal como tipo penal específico – separadamente do estelionato comum – e tipificá-lo como crime de alto potencial ofensivo, com pena de 3 a 8 anos de reclusão e multa. A proposta legislativa prevê ainda:
– Agravamento da pena em 1/3 quando houver uso de perfis falsos em redes sociais ou aplicativos de relacionamento para a prática do crime;
– Pena aumentada para até 10 anos se a vítima for idosa;
– Inclusão do crime na Lei Maria da Penha e no Estatuto do Idoso.
A decisão do STJ e o Projeto de Lei 69/2025 refletem uma resposta institucional ao uso fraudulento de vínculos emocionais para obtenção de benefício ilícito. Para o Direito Penal contemporâneo, trata-se de um avanço necessário frente à sofisticação das práticas fraudulentas, muitas vezes praticadas no ambiente digital e em contextos de vulnerabilidade afetiva. A formalização dessa figura típica poderá trazer maior segurança jurídica, facilitar a persecução penal e proteger as vítimas de forma mais eficaz.
Fontes: STJ e CAMARA LEG