Newsletter | Direito Público e Regulatório

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Licitações e contratos

Mais agilidade nas compras públicas: sancionada a lei que cria o Sistema de Compras Expressas (SICX)

Foi sancionada e publicada em 24.11.2025 a Lei nº 15.266/2025, que altera a Lei nº 14.133/2021 (Lei de Licitações e Contratos Administrativos) para instituir o Sistema de Compras Expressas (Sicx). A nova disciplina inclui o comércio eletrônico como hipótese de credenciamento, voltada à contratação de bens e serviços comuns padronizados ofertados em ambiente eletrônico, com o objetivo de conferir maior agilidade, eficiência e transparência às compras públicas e de facilitar a participação de micro e pequenas empresas.


Na prática, a lei insere o Sicx no microssistema da Lei nº 14.133/2021 como plataforma de marketplace público, por meio da qual a Administração poderá contratar fornecedores previamente credenciados, com parâmetros de padronização e preços definidos de forma centralizada. Caberá ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) regulamentar as condições de admissão e permanência dos fornecedores, as regras de inclusão de bens e serviços e de formação e revisão de preços, os prazos e métodos de entrega e recebimento, bem como as condições de pagamento – com prazo máximo de 30 dias contados do recebimento – e o regime sancionatório aplicável.

Do ponto de vista federativo, a norma é de eficácia dependente de regulamentação, mas já se discute o alcance do futuro decreto federal. Embora a própria Lei nº 14.133/2021 remeta ao regulamento da União para detalhar o funcionamento do Sicx, isso não deve implicar em subordinação automática de Estados e Municípios a esse decreto, sob pena de afronta à autonomia dos entes. Nesses casos, a solução adequada é que cada ente possa editar regulamentação própria, inclusive para disciplinar eventual adesão a plataformas públicas ou privadas integradas ao Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP).

Do ponto de vista do mercado, o Sicx tende a reconfigurar o segmento de fornecimento de bens e serviços padronizados à Administração. Fornecedores que estruturarem catálogos padronizados, políticas de preços competitivos, logística eficiente e mecanismos robustos de compliance e integridade terão vantagem na disputa por demanda recorrente em ambiente digital. Ao mesmo tempo, gestores públicos precisarão adaptar rotinas de planejamento, gestão de riscos e governança das contratações para utilizar o Sicx de forma estratégica, aproveitando a expansão do programa Contrata+Brasil e o potencial de uso do poder de compra estatal para fomentar o desenvolvimento local e reduzir custos transacionais nas compras públicas.

Aeroportos

Programa Ampliar estreia com leilão de 13 aeroportos regionais na B3

Em 27.11.2025, o Ministério de Portos e Aeroportos (MPor) e a Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC) realizaram, na B3, o primeiro leilão do Programa AmpliAr, voltado à inclusão de aeroportos regionais em contratos federais de concessão já existentes. Dos 19 terminais ofertados na Amazônia Legal, Nordeste e Centro-Oeste, 13 foram arrematados, com previsão de cerca de R$ 731,6 milhões em investimentos privados em obras de pistas, pátios e terminais de passageiros. A concessionária do Aeroporto Internacional de Guarulhos (GRU Airport) saiu como principal vencedora, ao assumir 12 aeroportos regionais, enquanto a Fraport Brasil ficou com o aeroporto de Jericoacoara (CE).


Os ativos conquistados pela GRU Airport se distribuem por Bahia, Ceará, Maranhão, Mato Grosso, Pernambuco, Piauí, Rondônia e Tocantins, incluindo destinos turísticos e polos regionais como Paulo Afonso e Lençóis (BA), Barreirinhas (MA), Canoa Quebrada (CE), Cacoal e Vilhena (RO), entre outros. De acordo com as informações oficiais, o pacote de 12 aeroportos exigirá investimentos da ordem de R$ 630 milhões, concentrados em melhorias de infraestrutura e segurança operacional, com contratos de 30 anos e mecanismos específicos de reequilíbrio econômico-financeiro.

O desenho regulatório do AmpliAr é um dos pontos centrais para operadores e potenciais parceiros privados. Apenas concessionárias que já administram aeroportos federais puderam disputar os ativos, justamente porque o programa parte da premissa de que se tratam de terminais deficitários: o governo projeta receitas, investimentos e custos operacionais e calcula um fluxo de caixa negativo de referência. O critério de julgamento é o maior deságio sobre esse déficit projetado, indicando qual parcela desse desequilíbrio econômico-financeiro o operador aceita absorver em troca de um futuro reequilíbrio contratual em seus ativos principais, que pode envolver, por exemplo, extensão de prazo ou outras contrapartidas econômicas. No certame, a GRU Airport arrematou seus 12 aeroportos com deságio zero, ao passo que a Fraport ofereceu deságio de 100% em Jericoacoara.

Entre dezembro de 2025 e março de 2026 está prevista a elaboração dos termos aditivos que oficializam a incorporação dos novos aeroportos aos contratos existentes, sob supervisão da ANAC, etapa em que se consolidam cronogramas de obras, metas de desempenho e parâmetros de reequilíbrio, devendo a assinatura do contrato e transferência da gestão operacional ocorrer em sequência.

Portos

“Outorga Verde”: sandbox da ANTAQ testa projetos portuários voltados à transição energética

A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) escolheu o projeto “Outorga Verde” como tema inaugural do seu ambiente regulatório experimental, o chamado sandbox regulatório. A iniciativa, formalizada pela Resolução ANTAQ nº 131/2025 e pelo Edital de Participação nº 01/2025, busca selecionar empresas para ocupar e explorar áreas ociosas em portos organizados com projetos inovadores ligados à transição energética e ao uso de tecnologias emergentes. As inscrições vão de 10 de novembro a 9 de dezembro de 2025, com divulgação do resultado final prevista para fevereiro de 2026.


O sandbox cria um ambiente controlado de testes, em que empresas poderão desenvolver modelos de negócios e soluções tecnológicas sob regras específicas, mais flexíveis que a regulação ordinária, mas ainda assim supervisionadas pela ANTAQ. A autarquia aponta como áreas de interesse, entre outras: geração de energia renovável em áreas portuárias, infraestrutura para combustíveis alternativos, eletrificação de operações, abastecimento de navios com combustíveis menos poluentes (bunkering), implantação de sistemas de fornecimento de energia em terra (Onshore Power Supply – OPS), bem como projetos voltados à descarbonização, adaptação climática e resiliência das instalações portuárias. Todos os investimentos devem ser realizados pelas empresas selecionadas, no prazo global estimado de quatro anos de duração do projeto.

Do ponto de vista regulatório, o Outorga Verde funciona como um laboratório para calibrar incentivos e obrigações em matéria de sustentabilidade portuária sem, de imediato, cristalizar esse arranjo em normas permanentes. A ANTAQ instituiu comissão específica para gerir o sandbox, estruturou procedimento de chamamento público e estabeleceu que as autorizações terão caráter temporário e experimental, com definição clara de objetivos, indicadores de desempenho e critérios para avaliação de riscos e benefícios ao final do ciclo. O Acórdão nº 703/2025, da Diretoria Colegiada, trata justamente de ajustes no edital e nos anexos, reforçando o cuidado formal com a seleção de projetos e com a transparência do processo.

Para potenciais interessados, o sandbox abre janela concreta de experimentação regulatória. Projetos aprovados tendem a antecipar tendências de regulação em temas como emissões, uso de combustíveis verdes, exigências de infraestrutura elétrica em berços e novos parâmetros de eficiência ambiental. A participação, por outro lado, exigirá estrutura de compliance regulatório, gestão de riscos ambientais e capacidade de demonstrar resultados mensuráveis, já que a experiência do Outorga Verde pode servir de base para futuras normas vinculantes no setor portuário e para a redefinição de exigências em concessões e arrendamentos.

Rodovias

TCU aperta o crivo sobre a modelagem da concessão da “Rota das Gerais” (BR-116/251/MG)

O Tribunal de Contas da União realizou fiscalização no processo de desestatização do sistema rodoviário BR-116/251/MG, conhecido como “Rota das Gerais”, um dos maiores projetos de concessão federal em Minas Gerais, com quase 735 km de extensão entre a divisa com a Bahia e Governador Valadares. Na análise dos estudos e documentos preparatórios – Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental (EVTEA), plano de concessão, editais e contratos preliminares, Programa de Exploração da Rodovia (PER) e Modelo Econômico-Financeiro (MEF) – a Corte identificou inconsistências relevantes, especialmente no modelo econômico-financeiro, no mecanismo regulatório e na estimativa de custos de obras e serviços.


Entre os pontos sensíveis, o TCU apontou problemas na forma de aplicar o mecanismo tarifário, na definição de trechos homogêneos e de cobertura de pedágio, bem como na estimativa de distâncias médias de transporte de insumos e na previsão de faixas adicionais e alargamentos já existentes em certos segmentos. O Acórdão 2726/2025 – Plenário determinou que a ANTT revise parâmetros de custos operacionais – inclusive mão de obra em praças de pedágio e balanças, com impacto estimado superior a R$ 700 milhões – e reavalie soluções de engenharia para trechos específicos da rodovia, antes de autorizar o lançamento do edital de licitação.

A decisão não inviabiliza a concessão, mas condiciona o avanço do projeto a ajustes estruturais na modelagem, reforçando o papel do TCU como instância de controle prévio da qualidade técnica e econômico-financeira das desestatizações rodoviárias. O relator destacou, inclusive, que parte das recomendações já vinha sendo incorporada pela ANTT, com a priorização de obras em obras de arte especiais (pontes e viadutos) em situação crítica, antecipando intervenções em relação ao cronograma originalmente proposto.

Para investidores, operadores de rodovias, financiadores e empresas de engenharia, o caso da Rota das Gerais é um indicativo claro de que o pipeline de concessões federais virá acompanhado de escrutínio mais fino sobre suposições de tráfego, custos e matriz de riscos. Modelagens que subavaliem custos operacionais ou superdimensionem ganhos de eficiência tendem a ser questionadas, com reflexos em tarifa-teto, CAPEX obrigatório e cronogramas de investimentos. Do ponto de vista estratégico, acompanhar de perto esses acórdãos do TCU passa a ser tão relevante quanto monitorar as audiências públicas da ANTT, já que é nessa etapa que se definem, de fato, as condições de competição e a atratividade econômica dos futuros leilões.

STF rejeita pedido de suspensão do TCE-MT em disputa sobre habilitação em concessão rodoviária

Em 07.11.2025, o Supremo Tribunal Federal apreciou pedido de Suspensão de Segurança formulado pelo Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso (TCE-MT), por meio do qual se buscava sustar decisão do Tribunal de Justiça local que havia mantido habilitada a empresa Monte Rodovias S.A. em concorrência pública internacional para concessão das rodovias MT-170 e MT-220, com investimentos estimados em R$ 4,2 bilhões e prazo contratual de 30 anos. Ao final, o ministro Edson Fachin, na qualidade de presidente do STF, não conheceu do pedido, de modo que permaneceram vigentes os efeitos da decisão do TJMT que suspendera o acórdão do TCE-MT e o ato administrativo que anulava a habilitação e a adjudicação em favor da empresa.


Na decisão, o ministro reconstrói o contexto do mandado de segurança originário, inclusive destacando que o TJMT, em juízo de cognição sumária, vislumbrou possível inovação indevida das regras do certame ao exigir, após a fase de propostas, a apresentação de Certidão de Acervo Operacional (CAO) não prevista de forma expressa no edital. No entanto, Fachin deixa claro que não cabe, na via da Suspensão de Segurança, reexaminar o acerto ou desacerto dessa conclusão, pois o incidente de contracautela tem natureza excepcional e objetivo restrito: evitar grave lesão à ordem, à saúde, à segurança ou à economia públicas.

Com base na jurisprudência consolidada do STF sobre o tema, a decisão enfatiza que a Suspensão de Segurança não funciona como sucedâneo recursal, nem como instrumento para rediscutir provas ou interpretar legislação infraconstitucional. Para que o pedido seja sequer conhecido na Suprema Corte, exige-se, além da demonstração de grave lesão ao interesse público, que a controvérsia de fundo envolva matéria constitucional direta. No caso concreto, o ministro identifica que o debate gira em torno da aplicação da Lei nº 14.133/2021, da leitura de cláusulas editalícias e da avaliação da suficiência da documentação de habilitação, o que demandaria reexame fático-probatório e de normas infraconstitucionais – algo incompatível com a via eleita.

Fachin também assinala que a decisão do TJMT não suprime o poder geral de cautela dos tribunais de contas, mas apenas afasta, naquele caso específico, o ato que anulou a homologação e a adjudicação sem considerar adequadamente as particularidades da situação. A discussão sobre a extensão das competências do TCE-MT permanece, assim, no âmbito das instâncias próprias (mandado de segurança em curso no TJMT), não sendo objeto de definição de tese pelo STF nesse incidente.

Do ponto de vista prático, a decisão reforça duas mensagens para agentes públicos e empresas envolvidas em licitações de concessões: (i) controvérsias sobre habilitação, documentos técnicos e interpretação de edital tendem a permanecer, em regra, no campo das instâncias ordinárias, não encontrando espaço na Suspensão de Segurança perante o STF; e (ii) a atuação de tribunais de contas continua sujeita a controle judicial, mas o debate sobre vinculação ao edital, exigências supervenientes e suficiência da documentação é, essencialmente, questão de legalidade infraconstitucional, a ser resolvida no processo de origem e não em sede de contracautela na Suprema Corte.

Ferrovias

Governo lança política ferroviária e divulga carteira de 21 concessões para 2026

Em 25.11.2025, o Ministério dos Transportes e a Agência Nacional de Transporte terrestres (ANTT) anunciaram, em evento em Brasília, a criação da Política Nacional de Concessões Ferroviárias e, simultaneamente, apresentaram a carteira de projetos da pasta para 2026. Segundo os dados oficiais, a programação prevê 21 leilões de infraestrutura, sendo 8 ferroviários e 13 rodoviários, com expectativa de aproximadamente R$ 288-290 bilhões em investimentos ao longo dos contratos. No eixo ferroviário, a carteira soma mais de 9 mil quilômetros de trilhos, com cerca de R$ 140 bilhões em investimentos diretos e potencial de até R$ 600 bilhões em aportes ao longo da vida das concessões.


A nova política ferroviária é apresentada como um conjunto de diretrizes para planejamento, governança, sustentabilidade e financiamento das concessões, funcionando como referência para decisões de renovação, relicitação e novos projetos. Entre os empreendimentos citados estão o Anel Ferroviário do Sudeste, a Ferrogrão (EF-170), a Malha Oeste e corredores da Malha Sul, além de projetos voltados ao transporte de passageiros em trechos hoje ociosos. Já no modal rodoviário, a carteira divulgada prevê 13 concessões federais, com estimativa de cerca de R$ 148 bilhões em investimentos, combinando novos trechos e contratos de otimização de concessões existentes, com inclusão de obras adicionais e ajustes de capacidade.

Para empresas que atuam em concessões, infraestrutura de transportes e financiamento de longo prazo, o anúncio não altera, por si só, as condições regulatórias vigentes, mas oferece um sinal mais claro do pipeline público para 2026. A definição prévia dos projetos e dos volumes aproximados de investimento tende a orientar decisões de entrada em consórcios, estruturação de funding, planejamento de equipes de engenharia e organização de teses de investimento. Ao mesmo tempo, o detalhamento de cada modelagem ainda dependerá de editais e estudos específicos, bem como da atuação do TCU e das agências setoriais sobre premissas de demanda, matriz de riscos e mecanismos de reequilíbrio econômico-financeiro.