O STF e o setor de telecomunicações – a deferência à competência legislativa federal e à competência regulatória da ANATEL

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O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que o Judiciário não pode anular cláusula de contrato de concessão de serviço público firmado por agência reguladora que, em observância à lei, autoriza reajuste de tarifa telefônica em percentual superior ao índice inflacionário estipulado. A decisão decorreu do julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1059819, com repercussão geral reconhecida (Tema 991).

A maioria do Plenário acompanhou o entendimento do relator, ministro Marco Aurélio (aposentado), de que a interferência do Judiciário em ato autorizado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) afronta o princípio da separação dos Poderes.

A tese de repercussão geral aprovada foi a seguinte: “Afronta o princípio da separação dos poderes a anulação judicial de cláusula de contrato de concessão firmado por agência reguladora e prestadora de serviço de telefonia que, em observância aos marcos regulatórios estabelecidos pelo Legislador, autoriza a incidência de reajuste de alguns itens tarifários em percentual superior ao do índice inflacionário fixado, quando este não é superado pela média ponderada de todos os itens”.

Nesse ínterim, cabe destacar que aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal, a apreciação da Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 5399, referente à análise da inconstitucionalidade da Lei nº 15.854/2015 do Estado de São Paulo que previu a obrigatoriedade de os fornecedores de serviços prestados de forma contínua estenderem o benefício de novas promoções aos clientes preexistentes, criando obrigação desproporcional que se descumprida acarretará a imposição de multa e de cassação da inscrição estadual de concessionárias e operadoras no setor de telecomunicações. O caso havia sido incluído em pauta no dia 24/02/2022, contudo, foi excluído do calendário pelo Presidente da Corte.

Ressalte-se, por fim, que o STF concedeu liminar, ainda válida, para suspender a aplicação do art. 1º, parágrafo único, da referida norma paulista, no tocante aos serviços de telefonia móvel, restando aguardar o julgamento.

Com efeito, é de se destacar que as investidas e tentativas estaduais de interferência indevida no setor de telecomunicações não se restringem ao Estado de São Paulo, tampouco aos temas específicos acima destacados. No Estado do Rio de Janeiro, o Projeto de Lei nº 533/2015, em trâmite na ALERJ (Assembleia legislativa estadual), pretende obrigar as empresas prestadoras do serviço de internet a apresentar ao consumidor, na fatura mensal, gráficos que informem a velocidade diária média de envio e recebimento de dados entregues no mês.

Finalmente, cabe lembrar que, em diversas oportunidades, o STF assentou a inconstitucionalidade formal de normas estaduais e distritais que interferiam diretamente na atividade das concessionárias de serviços de telecomunicação diante do flagrante vício formal de competência ou iniciativa legislativa. A propósito, o Ministro do STF Gilmar Mendes destaca que: “(…) os vícios formais afetam o ato normativo singularmente considerado, sem atingir seu conteúdo, referindo-se aos pressupostos e procedimentos relativos à formação da lei. Os vícios formais traduzem defeito de formação do ato normativo, pela inobservância de princípio de ordem técnica ou procedimental ou pela violação de regras de competência. Nesses casos, viciado é o ato nos seus pressupostos, no seu procedimento de formação, na sua formal final.” A corte tem reiterado que a matéria deve ter tratamento uniforme no País, em razão do seu caráter nacional e destacando a Lei Geral de Telecomunicações (Lei 9.472/1997).