STJ discute início de cumprimento de nova pena em crime cometido durante livramento condicional
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) iniciou, no último dia 8 de outubro, o julgamento do Tema 1.367, que vai definir o início do cumprimento de nova pena quando o condenado, ainda em livramento condicional não revogado, comete outro crime.

A controvérsia teve origem em recursos interpostos pelo Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) contra decisões do Tribunal de Justiça que fixaram como termo inicial da nova execução penal a data da prisão cautelar decorrente do novo delito. O MPRJ, contudo, defende que a contagem da nova pena deve começar apenas após o término do benefício do livramento condicional, para evitar a sobreposição de execuções distintas, conforme prevê o artigo 111 da Lei de Execução Penal (“LEP” – Lei n.º 7.210/1984).
Por outro lado, as Defensorias Públicas do Rio de Janeiro e da União sustentaram tese mais benéfica ao réu, argumentando que o período de prisão preventiva que ocorre durante o livramento condicional deve ser considerado para fins de detração, uma vez que o benefício não equivale ao cumprimento da pena.
O relator, ministro Sebastião Reis Júnior, votou pelo provimento dos recursos interpostos pelo Ministério Público, propondo a fixação da tese de que, nos casos em que o condenado comete novo crime durante o período de prova do livramento condicional não revogado, o termo inicial da nova execução deve ser o dia seguinte ao término do benefício. O julgamento foi suspenso após pedido de vista do ministro Rogério Schietti Cruz.
A definição do tema possui impacto direto sobre a execução penal, especialmente quanto ao cálculo de penas, à progressão de regime e à detração. O resultado do julgamento deverá uniformizar o entendimento sobre a matéria e orientar a aplicação do artigo 111 da LEP em todo o país.
STJ define que crime de poluição ambiental é formal e dispensa perícia
A Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou, no Tema 1.377, o entendimento de que o crime de poluição ambiental previsto no art. 54, caput, da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) possui natureza formal e não exige a comprovação pericial do dano efetivo ao meio ambiente.

Segundo o STJ, basta a demonstração da potencialidade de risco à saúde humana para a configuração do delito, sem que seja necessário comprovar a materialização do prejuízo ambiental. Assim, outros meios de prova como testemunhos, relatórios técnicos ou documentos administrativos podem ser suficientes para atestar a conduta ilícita.
Na prática, a tese significa que empresas, indústrias ou quaisquer agentes que causem poluição “em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana” podem responder penalmente mesmo sem laudo pericial que demonstre materialidade ou mensure o dano.
O novo posicionamento reforça a tendência jurisprudencial de ampliar a tutela penal ambiental, priorizando a prevenção e a precaução em detrimento da comprovação do dano concreto. Para o setor empresarial, a decisão sinaliza a importância de fortalecer programas de compliance ambiental, com foco na gestão de riscos e na adoção de práticas sustentáveis que evitem a exposição a situações potencialmente lesivas.
Aspectos criminais da contaminação de bebidas alcoólicas por metanol
Nas últimas semanas, o país tem enfrentado um grave surto de intoxicações por bebidas alcoólicas adulteradas com metanol, o que levou as autoridades a intensificarem ações de fiscalização e investigação. O caso reacendeu o debate sobre a segurança dos produtos consumidos pela população e a necessidade de maior controle sobre a produção e a comercialização de bebidas no Brasil.

O Ministério da Saúde informou que o Brasil registrou, até a última segunda-feira (20), 47 casos confirmados de intoxicação por metanol relacionados ao consumo de bebidas alcóolicas adulteradas, além de 57 notificações ainda sob investigação. A maior parte das ocorrências concentra-se no estado de São Paulo, que acumula mais de 80% dos casos. Até o momento, nove mortes foram confirmadas, e outras sete permanecem em análise.
Diante da gravidade da situação, o Governo Federal implementou um plano de ação nacional, que inclui a instauração de inquérito pela Polícia Federal para apurar a existência de uma possível rede de distribuição ilícita de bebidas adulteradas com metanol.
Sob a ótica do Direito Penal, considerando os indícios de atuação interestadual da organização, compete à Polícia Federal a investigação dos fatos, conforme preceitua o artigo 144, §1º, I, da Constituição Federal. Após a identificação da autoria, as condutas poderão se enquadrar nos crimes de organização criminosa (art. 2º da Lei n.º 12.850/2013) e falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produtos destinados ao consumo (art. 272, §1º-A c/c §1º do Código Penal). Quanto às vítimas, é possível o enquadramento nos crimes de homicídio e lesão corporal (art. 121 e 129, respectivamente, do Código Penal), podendo figurarem em suas modalidades qualificadas por dolo eventual. Ainda, é cabível a análise de um possível crime contra as relações de consumo (art. 7º da Lei n.º 8.137/1990).
Nesse contexto, a tragédia decorrente da adulteração de bebidas com metanol evidencia a urgência de políticas públicas integradas, que conciliem fiscalização efetiva, proteção ao consumidor e prevenção de riscos à saúde coletiva. O debate que se impõe ultrapassa o aspecto punitivo, exigindo a construção de mecanismos capazes de prevenir novas ocorrências e fortalecer a atuação penal, administrativa e consumerista do Estado.
“Quem matou Odete Roitman?” – o caso que marcou a ficção e gera debates no Direito Penal
O encerramento do remake de Vale Tudo reacendeu um dos marcos da teledramaturgia brasileira: a morte de Odete Roitman. Mais de três décadas após a exibição original, o episódio continua a suscitar debates não apenas no campo cultural, mas também sob a ótica jurídico-penal.

A trama, ao revelar o desfecho de um crime movido por impulsos emocionais intensos, oferece um ponto de partida instigante para reflexões sobre dolo, culpa, violenta emoção e responsabilidade penal subjetiva. No contexto jurídico, situações como a retratada evidenciam a complexidade da análise da intenção do agente e da influência das circunstâncias psicológicas sobre a conduta criminosa.
À luz do Direito Penal contemporâneo, a discussão remete à aplicação do art. 121, §1º, do Código Penal — que prevê a hipótese de homicídio privilegiado quando o agente atua sob violenta emoção, logo após injusta provocação da vítima. O caso fictício convida, portanto, à ponderação sobre os critérios de valoração da culpabilidade e os limites da compreensão humana diante de conflitos passionais.
Além disso, as cenas que retrataram os depoimentos dos cinco suspeitos geraram debate pelo fato de todos estarem desacompanhados dos seus advogados durante as oitivas na delegacia. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), manifestou-se sobre o caso, destacando que “ninguém deve ser ouvido em investigação, interrogatório ou audiência sem assistência jurídica. É isso que garante um processo justo e equilibrado”.
Mais do que um programa televisivo, as novelas reafirmam como a arte pode servir de espelho para a sociedade e para o próprio Direito, ao retratar dilemas morais e jurídicos que permanecem atemporais.
33 anos do Massacre do Carandiru: sistema prisional brasileiro ainda enfrenta desafios estruturais
Em 2 de outubro de 1992, o país testemunhou uma das mais graves violações de direitos humanos de sua história: o Massacre do Carandiru. Na ocasião, 111 pessoas privadas de liberdade foram mortas por policiais militares durante uma intervenção no Pavilhão 9 da Casa de Detenção de São Paulo, que abrigava mais que o dobro de detentos do que a sua capacidade. Mais de três décadas depois, as marcas deste episódio continuam presentes não apenas na memória coletiva, mas na estrutura e na lógica do sistema prisional brasileiro.

A tragédia também teve repercussão internacional: em 2000, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos responsabilizou o Estado brasileiro por violar o direito à vida e à integridade pessoal, recomendando reparações e medidas estruturais. Contudo, mais de vinte anos depois, apenas parte das famílias das vítimas foi indenizada, e o cenário prisional segue em crise.
O massacre permanece como um símbolo da falência do modelo punitivo brasileiro, ainda marcado pela superlotação carcerária, pela violência institucional e pela ausência de políticas efetivas de reintegração social. De acordo com o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC), o país abriga mais de 850 mil pessoas privadas de liberdade (a terceira maior do mundo), com um déficit que ultrapassa 200 mil vagas, e cerca de um terço das unidades prisionais foi avaliado com condições ruins ou péssimas entre 2023 e 2024, o que revela a persistência de um sistema estruturalmente em crise.
Diante desse cenário, em 2015, o Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgar a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.° 347, reconheceu o sistema carcerário como um “Estado de Coisas Inconstitucional”, tendo em vista o cenário de grave e massiva violação de direitos fundamentais dos presos.
Os reflexos do Carandiru, portanto, ultrapassam a dimensão histórica. A ausência de medidas estruturais efetivas contribui para a perpetuação de um ambiente de violações, em que a lógica punitiva prevalece sobre a função ressocializadora da pena, e o controle estatal incide de forma desproporcional sobre os grupos mais vulneráveis.
Mais do que uma lembrança trágica, o Massacre do Carandiru é um alerta permanente: a reforma do sistema prisional é uma urgência constitucional, e a tutela jurisdicional dos direitos das pessoas privadas de liberdade continua sendo um dos grandes desafios do Estado Democrático de Direito.
Fontes: Migalhas | Conectas.org | GOV | STF
Quinta Turma do STJ decide que juiz não pode decretar prisão quando o Ministério Público requer medidas menos gravosas
Em recente julgamento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu que o magistrado não pode converter prisão em flagrante em prisão preventiva quando o Ministério Público requer expressamente a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão. A decisão, proferida em 15 de outubro de 2025, reforça os limites de atuação judicial no âmbito do sistema acusatório e reafirma a necessidade de respeito à iniciativa das partes no processo penal.

O caso teve origem em uma prisão por tráfico de drogas, na qual foram apreendidos cerca de 354 gramas de maconha. Durante a audiência de custódia, o Ministério Público opinou pela concessão de liberdade provisória, com imposição de cautelares alternativas. Ainda assim, o juízo de primeiro grau determinou a prisão preventiva, decisão mantida pelo tribunal estadual. Ao analisar o habeas corpus, o STJ entendeu que houve violação aos artigos 282, §2º, e 311 do Código de Processo Penal, uma vez que a prisão preventiva foi decretada sem provocação da acusação e em descompasso com o pedido formulado.
O relator, ministro Joel Ilan Paciornik, destacou que, ao impor medida mais severa do que a requerida pelo Ministério Público, o juiz ultrapassou os limites da provocação e agiu de ofício, o que contraria o modelo acusatório adotado pela Constituição Federal e reforçado pelas reformas processuais penais recentes. Segundo o voto, a conduta judicial compromete a imparcialidade e o equilíbrio processual, na medida em que confunde os papéis de quem acusa e de quem julga.
O entendimento da Quinta Turma reforça a aplicação dos princípios do sistema acusatório no processo penal brasileiro, ao destacar a importância da imparcialidade judicial e do respeito ao devido processo legal. A decisão contribui para consolidar a interpretação de que a decretação da prisão preventiva deve observar os limites da provocação das partes e os parâmetros constitucionais que regem a atuação do Poder Judiciário.
Fonte: STJ